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Bateria nuclear: Não precisa ser recarregada e dura para sempre

Pode parecer um tanto assustador, mas a bateria nuclear é segura, não precisa recarregar e dura décadas. [Imagem: Elena Khavina/MIPT]
Bateria nuclear sem riscos
Seu próximo telefone celular, ou mesmo seu carro elétrico, poderão ser alimentados por uma bateria nuclear, em lugar das baterias de íons de lítio, graças a um avanço feito por pesquisadores russos.
E não é preciso se preocupar, porque a radiação envolvida nessa bateria nuclear é de baixa energia, podendo ser bloqueada até mesmo por uma folha de papel - o invólucro da bateria é mais do que suficiente para torná-la segura.
A tecnologia das baterias nucleares - betavoltaica ou betabaterias - foi de fato usada na década de 1970 para alimentar marcapassos cardíacos, antes de ser superada pelas baterias de íons de lítio, com vidas úteis muito mais curtas, mas também mais baratas. Além disso, naquela época as baterias nucleares ainda não haviam sido miniaturizadas.
A bateria nuclear, que funciona a partir do decaimento beta de um isótopo radioativo do níquel - o níquel-63 - foi criada por uma equipe do Instituto de Física e Tecnologia de Moscou (MIPT), Instituto Tecnológico de Materiais Superduros e Avançados de Carbono (TISNCM) e da Universidade Nacional de Ciência e Tecnologia (MISIS).
O protótipo fornece cerca de 3.300 miliwatts-hora de energia por grama, mais do que em qualquer outra bateria nuclear do mesmo tipo e 10 vezes mais do que a energia específica das baterias químicas atuais.
Esta é uma foto do protótipo da bateria nuclear, ainda fora do invólucro. [Imagem: TISNCM]
Como funcionam as pilhas e baterias
As baterias químicas comuns, como as pilhas e as baterias de lítio dos celulares, também conhecidas como células galvânicas, usam a energia das reações químicas de redução-oxidação, ou redox. Nessas reações, os elétrons são transferidos de um eletrodo para outro através de um eletrólito, dando origem a uma diferença de potencial entre os eletrodos. Se os dois terminais da bateria forem conectados por um condutor, os elétrons começam a fluir para equilibrar a diferença de potencial, gerando uma corrente elétrica.
Essas baterias químicas são caracterizadas por uma alta densidade de potência - a relação entre a potência da corrente gerada e o volume da bateria. No entanto, elas descarregam em um tempo relativamente curto (pilhas comuns) ou precisam ser recarregadas (baterias recarregáveis). Essa não é uma boa ideia em aplicações como marcapassos cardíacos, porque isso exige cirurgias adicionais, ou pode até mesmo ser impossível, no caso de a bateria estar alimentando uma espaçonave.
Felizmente, as reações químicas são apenas uma das possíveis fontes de geração de energia elétrica - a betavoltaica é outra.
Esquema da bateria nuclear de níquel-63 e semicondutores de diamante. [Imagem: V. Bormashov et al. - 10.1016/j.diamond.2018.03.006]
O que são baterias nucleares?
Uma bateria nuclear pode ser um nome amedrontador, mas a bateria betavoltaica trabalha com materiais semicondutores para converter a energia do decaimento beta em eletricidade.
As partículas beta de baixa energia - elétrons e pósitrons e, possivelmente, neutrinos - emitidas pelo elemento radioativo, ionizam os átomos do semicondutor, criando o mesmo desequilíbrio de cargas visto nas baterias químicas. Na presença do campo estático de uma estrutura p-n - positivo-negativo, a mesma estrutura semicondutora usada para fazer diodos e transistores - as cargas fluem numa direção, resultando em uma corrente elétrica.
A principal vantagem das células betavoltaicas sobre as células galvânicas é a sua longevidade: os isótopos radioativos usados nas baterias nucleares têm uma meia-vida que varia de dezenas a centenas de anos, de modo que sua potência permanece quase constante por muito tempo - em termos práticos, são baterias para a vida toda, ou mesmo para várias vidas.
Embora essa tecnologia fosse conhecida há décadas, agora, pela primeira vez, as baterias nucleares alcançaram uma densidade de energia que as torna competitivas com as baterias químicas.
Observe que as baterias betavoltaicas não devem ser confundidas com os geradores termoelétricos de radioisótopos, usados nos robôs marcianos, como o Curiosity, e na sonda espacial New Horizons, que explorou Plutão e continua em busca de outros corpos celestes nunca vistos. Esse tipo de gerador nuclear converte o calor liberado pelo decaimento radioativo em eletricidade usando termopares, mas com uma eficiência de poucos pontos percentuais. Seu uso prático é limitado na Terra devido ao combustível radioativo, tipicamente o plutônio-238, que impõe riscos à saúde, é difícil de reciclar e pode vazar para o ambiente - a betavoltaica não impõe esses riscos.
As baterias atômicas são diferentes dos geradores termoelétricos de radioisótoposusados em naves espaciais. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Bateria eterna
A nova bateria betavoltaica usa níquel-63 como fonte de radiação e diodos de barreira Schottky feitos de diamante para a conversão de energia. Várias equipes vêm tentando usar semicondutores de diamante para fazer baterias que dispensam recarga, mas ninguém havia alcançado a eficiência obtida agora pelo grupo da Rússia.
O protótipo contém 200 conversores de diamante intercalados com camadas de níquel-63 e camadas de isótopos estáveis de níquel. A quantidade de energia gerada depende da espessura da folha de níquel e do próprio conversor, porque ambos afetam quantas partículas beta são absorvidas.
O protótipo da bateria nuclear alcançou uma potência de saída de cerca de 1 microwatt, enquanto a densidade de potência por centímetro cúbico foi de 10 microwatts, o que é suficiente para alimentar um marcapasso artificial.
A tensão de circuito aberto é de 1,02 volt e a corrente de curto-circuito de 1,27 microampere. A potência máxima de saída, de 0,93 microwatt, é fornecida a 0,92 volt. Como o níquel-63 tem uma meia-vida de 100 anos, essa potência corresponde a uma potência específica de cerca de 3.300 miliwatts-hora por grama, o que é 10 vezes mais do que as pilhas e baterias químicas disponíveis comercialmente.
Existem também tecnologias menos maduras, como um gerador nuclear à base de água, com potencial de substituir as atuais baterias. [Imagem: Kim Kwon et al. - 10.1038/srep05249]
Futuro das baterias nucleares
A eficiência alcançada pela equipe russa abre perspectivas reais para o retorno das baterias nucleares às aplicações médicas. A maioria dos marcapassos cardíacos de última geração tem mais de 10 centímetros cúbicos de tamanho e requer cerca de 10 microwatts de energia. Isso significa que a nova bateria nuclear pode ser usada para alimentar esses dispositivos sem qualquer alteração significativa em seu design e tamanho - seriam então "marcapassos perpétuos", cujas baterias não precisariam ser substituídas ou recarregadas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes e eliminando o risco das cirurgias de reposição.
A indústria espacial também pode se beneficiar bastante das baterias nucleares compactas. Em particular, existe uma demanda por sensores externos sem fio autônomos e chips de memória com sistemas integrados de fornecimento de energia para espaçonaves. E o diamante é um dos semicondutores mais resistentes à radiação e aos rigores de temperatura do espaço.
"Os resultados até agora já são bastante notáveis e podem ser aplicados na medicina e na tecnologia espacial, mas estamos planejando fazer mais. Nos últimos anos, nosso instituto teve bastante sucesso na síntese de diamantes dopados de alta qualidade, particularmente aqueles com condutividade do tipo n [negativo]. Isso nos permitirá fazer a transição das barreiras Schottky para estruturas p-i-n [positivo-intrínseco-negativo] e, assim, alcançar uma potência da bateria três vezes maior," disse o professor Vladimir Blank, coordenador da equipe.
Bibliografia:
High power density nuclear battery prototype based on diamond Schottky diodes
V. S. Bormashov, S. Yu. Troschiev, S. A. Tarelkin, A. P. Volkov, D. V. Teteruk, A. V. Golovanov, M. S. Kuznetsov, N. V. Kornilov, S. A. Terentiev, Vladimir D. 
BlankDiamond and Related Materials
Vol.: 84, Pages 41-47DOI: 10.1016/j.diamond.2018.03.006
Enviado por José Luiz Martins (RJ)
Postado por Cláudio H. Dahne (Ciências Biológicas - UFC)

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