Pular para o conteúdo principal

1 bilhão de dólares para encontrar a fórmula do cérebro

Para Allan Jones, presidente do Allen Institute, a neurociência vive a mesma excitação que a química teve no século 19
Cérebro
(Artem Chernyshevych/SXC)
Com um plano de investimento de 1 bilhão de dólares para pesquisa sobre o cérebro até 2022, o Allen Institute — criado pelo empresário, cofundador da empresa de tecnologia Microsoft e filantropo Paul Allen — é um dos artífices do Brain Initiative, um esforço do governo americano em busca de tecnologias para a cura de doenças como demência e Parkinson.

A instituição é presidida por Allan Jones, consultor do Fórum Econômico Mundial e doutor em biologia, à frente de um time de 450 pessoas, sendo 150 delas pós-graduadas em disciplinas como matemática aplicada, genética e eletrofisiologia. A interdisciplinaridade é fundamental para a árdua tarefa de descobrir como o cérebro funciona. Da sede do instituto, em Seattle, Jones concedeu a seguinte entrevista a EXAME.

O senhor já falou que a pesquisa sobre o cérebro é a área mais excitante da ciência nos dias atuais. Por que a neurociência é a nova fronteira do conhecimento?

A comparação que eu tenho usado recentemente é que a neurociência está hoje no mesmo momento que a química estava no final do século 19. Nós sabemos muito sobre o que o cérebro comanda em nosso corpo, sabemos alguma coisa sobre seu mecanismo interno, mas continuamos sem saber as regras gerais de seu funcionamento. O que estamos tentando fazer aqui é entender as diferentes células do cérebro e como elas se comportam. É por isso que eu gosto da analogia com a tabela periódica, porque o que ela fez pela química foi assentar uma época de descoberta. Uma vez que as regras ao redor da tabela periódica foram desvendadas, a humanidade começou a criar novos materiais. No caso da neurociência, nós estamos apenas agora começando a montar essa tabela periódica.

Como essa tabela periódica do cérebro funcionaria?


Nós temos 86 bilhões de células, os neurônios, no cérebro — um dado que, por sinal, foi uma descoberta feita por uma brasileira, a neurocientista Suzana Herculano-Houzel [leia entrevista na pág. 42]. Só que esses 86 bilhões de neurônios não são únicos entre si. Trabalhamos com a hipótese de que deve haver milhares de tipos de célula cerebral. Essa é uma ordem de grandeza muito boa de trabalhar. Uma vez que passarmos a conhecer quais são esses tipos, quais são suas propriedades físicas e elétricas e como eles se conectam com os outros grupos, então será possível entender melhor como o cérebro funciona, como todo o circuito cerebral trabalha. Isso nos dará a possibilidade de fazer novas combinações e modificar nosso cérebro para, primeiramente, curar doenças e, também acredito, realizar melhorias em nosso cérebro.

Como será possível curar doenças como Parkinson, Alzheimer e outros tipos de demência?

Quando pensamos em doenças neurodegenerativas, como Parkinson, Huntington ou Alzheimer, é preciso entender quais células estão morrendo primeiro para termos um diagnóstico precoce. Só que o fator-chave dessa área atualmente é que, na maioria das vezes, não é possível detectar nenhum desses problemas até que seja tarde demais. O que é mais incrível no cérebro humano é seu número de conexões. Portanto, a abordagem aqui será descobrir essas doenças no começo e usar as conexões para driblar as áreas que estão se degenerando. Isso poderá ser feito por implantes cerebrais, por exemplo.

O senhor estava tanto no lançamento do Brain Initiative, dos Estados Unidos, quanto no Human Brain Project, da União Europeia. Vivemos uma corrida pela compreensão do cérebro, como foi, por exemplo, a corrida espacial na Guerra Fria?

Costumo descrever que ocorre algo mais parecido com o que é a Estação Espacial Internacional. O cérebro é vasto, e há muito para saber e aprender sobre ele. É inútil tentar fazer os projetos americano e europeu parecerem uma competição. Ambos são esforços muito bons de cooperação global. Há também boas pesquisas no Japão e na Austrália. É a ciência transcendendo qualquer tipo de fronteira internacional ou agenda política para entender problemas muito complicados. O objetivo é beneficiar toda a humanidade.

Fonte: https://exame.abril.com.br/revista-exame/a-busca-da-formula-do-cerebro/

Postado por David Araripe

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Fármaco brasileiro aprovado nos Estados Unidos

  Em fotomicrografia, um macho de Schistosoma mansoni, causador da esquistossomose CDC/G. Healy A agência que regula a produção de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, a FDA, concedeu o status de orphan drug para o fármaco imunomodulador P-Mapa, desenvolvido pela rede de pesquisa Farmabrasilis, para uso no tratamento de esquistossomose.  A concessão desse status é uma forma de o governo norte-americano incentivar o desenvolvimento de medicamentos para doenças com mercado restrito, com uma prevalência de até 200 mil pessoas nos Estados Unidos, embora em outros países possa ser maior. Globalmente, a esquistossomose é uma das principais doenças negligenciadas, que atinge cerca de 200 milhões de pessoas no mundo e cerca de 7 milhões no Brasil.  Entre outros benefícios, o status de orphan drug confere facilidades para a realização de ensaios clínicos, após os quais, se bem-sucedidos, o fármaco poderá ser registrado e distribuído nos Estados Unidos, no Brasil e em outro...

CONSERVAÇÃO DE ALIMENTOS E A EQUAÇÃO DE ARRHENIUS por Carlos Bravo Diaz, Universidade de Vigo, Espanha

Traduzido por Natanael F. França Rocha, Florianópolis, Brasil  A conservação de alimentos sempre foi uma das principais preocupações do ser humano. Conhecemos, já há bastante tempo, formas de armazenar cereais e também a utilização de azeite para evitar o contato do alimento com o oxigênio do ar e minimizar sua oxidação. Neste blog, podemos encontrar diversos ensaios sobre os métodos tradicionais de conservação de alimentos. Com o passar do tempo, os alimentos sofrem alterações que resultam em variações em diferentes parâmetros que vão definir sua "qualidade". Por exemplo, podem sofrer reações químicas (oxidação lipídica, Maillard, etc.) e bioquímicas (escurecimento enzimático, lipólise, etc.), microbianas (que podem ser úteis, por exemplo a fermentação, ou indesejáveis caso haja crescimento de agentes patogênicos) e por alterações físicas (coalescência, agregação, etc.). Vamos observar agora a tabela abaixo sobre a conservação de alimentos. Por que usamo...

Ferramenta na internet corrige distorções do mapa-múndi

Tamanho do Brasil em relação aos países europeus (Google/Reprodução) Com ajuda da tecnologia digital, é possível comparar no mapa o real tamanho de nações e continentes Os países do mundo não são do tamanho que você imagina. Isso porque é quase inviável imprimir nos mapas, planos, em 2D, as reais proporções das nações e dos continentes. Mas agora, com a ajuda da tecnologia moderna, as distorções do mapa-múndi podem ser solucionadas. É exatamente o que faz o site The True Size Of (em inglês, ‘o verdadeiro tamanho de’). Ao entrar na plataforma é possível verificar o real tamanho de um país, comparando-o com qualquer outro do planeta. Por exemplo, o Brasil sozinho é maior que mais de vinte países da Europa juntos (confira na imagem acima). Por que é distorcido? O primeiro mapa-múndi retratado como conhecemos é do alemão Martin Waldseemüller, feito em 1507, 15 anos depois dos europeus chegarem à América com Cristóvão Colombo em 1492. Na projeção, observa-se uma África muito maior...