Pular para o conteúdo principal

Periódico retrata 107 artigos por ‘revisão comprometida’

Segundo editor da revista científica ‘Tumor Biology’ foram identificadas fraudes na revisão de alguns estudos sobre câncer publicados entre 2012 e 2016



Equipamento científico
Algumas das técnicas mais comuns para burlar o processo de revisão em pares
consistem em vender manuscritos prontos e falsificar contas e comentários
de revisores (iStockphoto/Getty Images)
O periódico científico Tumor Biology retratou 107 artigos sobre câncer publicados entre 2012 e 2016 na última sexta-feira. Em nota, o editor-chefe Torgny Stigbrand explica que os estudos receberam a menção porque tiveram sua “revisão comprometida”. Apesar de ainda estarem disponíveis para acesso, as pesquisas são desqualificadas pela revista e, sempre que alguém tenta acessá-las, um anúncio aparece indicando a retratação. Isso serve para alertar pesquisadores que queiram citar aquele artigo de que alguma fraude pode ter ocorrido durante o processo de publicação.
“Após uma investigação completa, nós temos fortes evidências para acreditar que o processo de revisão por pares foi comprometido”, escreve Stigbrand. Atualmente, a revisão por pares é o método mais prestigiado para avaliar artigos científicos antes de sua publicação. Ele consiste em submeter o trabalho científico à análise de um ou mais especialistas, que geralmente se mantêm anônimos, do mesmo escalão do autor. A maioria dos periódicos e prêmios utilizam esse modelo de revisão, e aqueles que optam por outros métodos tendem a ser vistos com desconfiança no meio acadêmico.
Segundo Stigbrand, a decisão de desqualificar os periódicos foi motivada por um pronunciamento do Comitê de Ética na Publicação (COPE, na sigla em inglês). Na nota, a entidade afirmou “ter ficado ciente de tentativas sistemáticas e inapropriadas de manipular o processo de revisão por pares de várias revistas de diferentes editores”. Segundo o comitê, as manipulações parecem ser orquestradas por agências que estariam oferecendo serviços aos autores, como manuscritos prontos e falsificação de comentários de revisores.

Fraudes científicas

Na maioria das vezes, os periódicos costumam pedir para os autores do artigo que está sendo revisado indicarem outros cientistas para avaliar seu trabalho. Isso, apesar de ser um mecanismo propício para falsificações, faz sentido quando o estudo é muito específico e poucos pesquisadores entendem do assunto. O esquema de fraudes, no entanto, alterava ou criava novas contas utilizadas para fazer comentários durante o processo de revisão, aproveitando as indicações para se passar por pesquisadores reais. Algumas das contas tinham nomes de especialistas existentes, mas estavam vinculadas a endereços de e-mail diferentes dos cadastrados oficialmente. Outras tinham nomes completamente fictícios.
A pressão da comunidade científica para que os pesquisadores publiquem cada vez mais artigos é um dos motivos pelos quais estudiosos consideram que a qualidade das pesquisas vem caindo, e esquemas fraudulentos estão se tornando cada vez mais comuns. Hoje em dia, o número de publicações em revistas científicas frequentemente é usado como referência para avaliar a relevância de um pesquisador no meio acadêmico.
No caso do periódico Tumor Biology, a maioria das publicações que foram retratadas eram de autores chineses – embora isso não signifique, necessariamente, que os artigos não eram de qualidade. O problema é que grande parte dos pesquisadores desse país confia em agências para traduzir seus trabalhos, abrindo espaço para que modificações e outras manipulações ocorram, com ou sem o consentimento de quem escreveu.
Segundo o Comitê de Ética na Publicação, ainda não está claro até que ponto os autores dos artigos estão cientes de certos tipos de fraudes feitas pelas agências, como nomes de revisores e endereços de e-mail falsos. Mesmo assim, a entidade orientou todos os editores que têm conhecimento de tais práticas em suas revistas a retratar as publicações suspeitas, contatar os autores e publicar uma nota em seus portais comunicando o ocorrido. Além disso, o comitê recomendou que os periódicos revisassem todos os seus bancos de dados e eliminassem todas as contas de revisores falsas, mesmo em artigos que não foram aceitos para publicação.


Postado por Hadson Bastos


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CONSERVAÇÃO DE ALIMENTOS E A EQUAÇÃO DE ARRHENIUS por Carlos Bravo Diaz, Universidade de Vigo, Espanha

Traduzido por Natanael F. França Rocha, Florianópolis, Brasil  A conservação de alimentos sempre foi uma das principais preocupações do ser humano. Conhecemos, já há bastante tempo, formas de armazenar cereais e também a utilização de azeite para evitar o contato do alimento com o oxigênio do ar e minimizar sua oxidação. Neste blog, podemos encontrar diversos ensaios sobre os métodos tradicionais de conservação de alimentos. Com o passar do tempo, os alimentos sofrem alterações que resultam em variações em diferentes parâmetros que vão definir sua "qualidade". Por exemplo, podem sofrer reações químicas (oxidação lipídica, Maillard, etc.) e bioquímicas (escurecimento enzimático, lipólise, etc.), microbianas (que podem ser úteis, por exemplo a fermentação, ou indesejáveis caso haja crescimento de agentes patogênicos) e por alterações físicas (coalescência, agregação, etc.). Vamos observar agora a tabela abaixo sobre a conservação de alimentos. Por que usamo...

Two new proteins connected to plant development discovered by scientists

The discovery in the model plant Arabidopsis of two new proteins, RICE1 and RICE2, could lead to better ways to regulate plant structure and the ability to resist crop stresses such as drought, and ultimately to improve agricultural productivity, according to researchers at Texas A&M AgriLife Research. Credit: Graphic courtesy of Dr. Xiuren Zhang, Texas A&M AgriLife Research The discovery of two new proteins could lead to better ways to regulate plant structure and the ability to resist crop stresses such as drought, thus improving agriculture productivity, according to researchers at Texas A&M AgriLife Research. The two proteins, named RICE1 and RICE2, are described in the May issue of the journal eLife, based on the work of Dr. Xiuren Zhang, AgriLife Research biochemist in College Station. Zhang explained that DNA contains all the information needed to build a body, and molecules of RNA take that how-to information to the sites in the cell where they can be used...

Fármaco brasileiro aprovado nos Estados Unidos

  Em fotomicrografia, um macho de Schistosoma mansoni, causador da esquistossomose CDC/G. Healy A agência que regula a produção de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, a FDA, concedeu o status de orphan drug para o fármaco imunomodulador P-Mapa, desenvolvido pela rede de pesquisa Farmabrasilis, para uso no tratamento de esquistossomose.  A concessão desse status é uma forma de o governo norte-americano incentivar o desenvolvimento de medicamentos para doenças com mercado restrito, com uma prevalência de até 200 mil pessoas nos Estados Unidos, embora em outros países possa ser maior. Globalmente, a esquistossomose é uma das principais doenças negligenciadas, que atinge cerca de 200 milhões de pessoas no mundo e cerca de 7 milhões no Brasil.  Entre outros benefícios, o status de orphan drug confere facilidades para a realização de ensaios clínicos, após os quais, se bem-sucedidos, o fármaco poderá ser registrado e distribuído nos Estados Unidos, no Brasil e em outro...