Pular para o conteúdo principal

Pesquisadoras brasileiras contribuem com metade da produção científica nacional

Painel “Mulheres na ciência” trouxe as pesquisadoras Helena Nader, Zebour Panossian, Alice Abreu e Daniele Botaro para discutir o tema nessa terça-feira, em São Paulo

Metade da produção científica brasileira é feita por mulheres. Estes são os dados apresentados pela professora Helena Nader, presidente de honra da SBPC, no painel “Mulheres na Ciência”, segundo debate do ciclo “CT&I para a Sustentabilidade” (CTI – ODS 2030), realizado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) nessa terça-feira, 9 de outubro, na sede da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em São Paulo. O evento contou ainda com a parceria do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Nader trouxe estudos da Academia de Ciências da África do Sul (ASSAf) que mostram que o Brasil tem cerca de 55% de mulheres participando de pesquisas científicas. Ela ressalta que esses dados contrastam com os de países chamados desenvolvidos, como os EUA e o Japão, em que há uma predominância masculina no meio científico.
Isso pode ser explicado pela proporção de mulheres brasileiras na pós-graduação, onde são maioria, segundo dados da Plataforma Sucupira (Capes/MEC). São 56% de mulheres tituladas mestres e 54% doutoras. Estudos da revista Nature apontam que na Holanda, por exemplo, apenas 29% dos doutores são mulheres e na Alemanha porcentagem feminina entre os que possuem doutorado é de cerca de 35%.
Entretanto, a pesquisadora aponta que ainda há um longo caminho a ser percorrido na busca pela equidade de gênero no meio científico. Como exemplo, ela cita a distribuição desigual das bolsas de produtividade do CNPq, em que o número de bolsas concedidas a mulheres é metade do número destinado aos homens. “Isso aqui é uma aberração, já foi feito esse diagnóstico mil vezes, mas isso continua, não mexe. Eu gostaria que desse debate nós conseguíssemos tirar propostas de políticas públicas”, comenta Nader.
O índice de impacto das pesquisadoras mulheres também está abaixo do índice masculino.  Enquanto as cientistas apresentam um índice menor do que 1, os pesquisadores apresentam um índice de 1.1, ou seja, têm um maior número de citações médias. Segundo estudos reportados em 2016 pela revista Nature, esse dado é afetado pelo fato de os homens tenderem a fazer mais auto-citações que as mulheres.
A presidente do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), Zehbour Panossian, trouxe alguns dados sobre a instituição que corroboram as estatísticas apresentadas por Helena Nader. Fundado em 1889, o instituto só teve o ingresso de uma mulher em 1935 e a primeira chefe de seção só foi nomeada em 1960. Entretanto, a situação vem sido revertida ao longo dos últimos anos e, atualmente, cerca de 40% dos cargos de chefia em áreas técnicas são ocupados por mulheres. Entre seus pesquisadores, mais de 50% são doutorandas.
No mercado de trabalho as mulheres ainda têm dificuldades de alcançar posições de gestão e quando alcançam são menos remuneradas por isso. Dados de um estudo da Catho trazidos pela diretora do CGEE, Regina Maria Silvério, apontam que em níveis de diretoria as mulheres recebem em média 32% a menos do que os homens. Nas carreiras científicas, elas recebem cerca de 15% a menos que os homens.
Daniele Botaro, doutora em ciências pela UFRJ e líder de desenvolvimento e inovação para América Latina na Oracle, afirma que discussões como essa feita no debate são muito importantes para mudar esse quadro. “A gente tinha uma estimativa de 80 anos para a equidade de gênero no mundo, já passamos para 97, hoje estamos em 130 no Brasil. Então, não é um processo que vai acontecer naturalmente. A gente precisa, sim, ter essas discussões, e como disse a Helena (Nader), a gente precisa ter políticas de ação”. Ela cita a licença maternidade como uma das políticas públicas de maior impacto nessa questão.

Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
Como pano de fundo de todo o debate estavam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), definidos pela ONU em conjunto com os Estados-membros em 2015. São 17 objetivos traçados para promover o desenvolvimento mundial até o ano de 2030. Entre eles estão a erradicação da pobreza, a promoção da educação de qualidade e a igualdade de gênero. Patrícia Menezes, co-fundadora da Rede ODS Brasil, destacou que a agenda tem como lema “não deixar ninguém para trás”.
O secretário do MCTIC, Álvaro Prata, lembrou que é necessário um esforço das comunidades locais na mobilização para contribuir com a agenda mundial do desenvolvimento sustentável. Segundo ele, o Ministério tem trabalhado no sentido de propor diversas ações em prol das mulheres, como a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia que este ano terá como tema a redução da desigualdade.
Também participou do debate a professora emérita da UFRJ, Alice Abreu, que comentou que os ODS só serão atingidos se a ciência for tida como base, já que muitos dos pontos específicos necessitam estudos e fundamento científico. “A gente também não pode imaginar que nenhum desses objetivos serão atingidos de forma eficaz se essa ciência não tiver levado em consideração uma perspectiva de gênero. Nenhum país hoje em dia se desenvolve menosprezando 50% dos seus cérebros. Nós estamos formando mulheres que têm competência e eficiência. É impossível que o Brasil vá para frente se deixarmos metade da nossa capacidade intelectual de lado”, afirma.
Amanda Oliveira – estagiária da SBPC, para o Jornal da Ciência


Postado por Cláudio H. Dahne (Ciências Biológicas - UFC)

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CONSERVAÇÃO DE ALIMENTOS E A EQUAÇÃO DE ARRHENIUS por Carlos Bravo Diaz, Universidade de Vigo, Espanha

Traduzido por Natanael F. França Rocha, Florianópolis, Brasil  A conservação de alimentos sempre foi uma das principais preocupações do ser humano. Conhecemos, já há bastante tempo, formas de armazenar cereais e também a utilização de azeite para evitar o contato do alimento com o oxigênio do ar e minimizar sua oxidação. Neste blog, podemos encontrar diversos ensaios sobre os métodos tradicionais de conservação de alimentos. Com o passar do tempo, os alimentos sofrem alterações que resultam em variações em diferentes parâmetros que vão definir sua "qualidade". Por exemplo, podem sofrer reações químicas (oxidação lipídica, Maillard, etc.) e bioquímicas (escurecimento enzimático, lipólise, etc.), microbianas (que podem ser úteis, por exemplo a fermentação, ou indesejáveis caso haja crescimento de agentes patogênicos) e por alterações físicas (coalescência, agregação, etc.). Vamos observar agora a tabela abaixo sobre a conservação de alimentos. Por que usamo...

Two new proteins connected to plant development discovered by scientists

The discovery in the model plant Arabidopsis of two new proteins, RICE1 and RICE2, could lead to better ways to regulate plant structure and the ability to resist crop stresses such as drought, and ultimately to improve agricultural productivity, according to researchers at Texas A&M AgriLife Research. Credit: Graphic courtesy of Dr. Xiuren Zhang, Texas A&M AgriLife Research The discovery of two new proteins could lead to better ways to regulate plant structure and the ability to resist crop stresses such as drought, thus improving agriculture productivity, according to researchers at Texas A&M AgriLife Research. The two proteins, named RICE1 and RICE2, are described in the May issue of the journal eLife, based on the work of Dr. Xiuren Zhang, AgriLife Research biochemist in College Station. Zhang explained that DNA contains all the information needed to build a body, and molecules of RNA take that how-to information to the sites in the cell where they can be used...

Fármaco brasileiro aprovado nos Estados Unidos

  Em fotomicrografia, um macho de Schistosoma mansoni, causador da esquistossomose CDC/G. Healy A agência que regula a produção de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, a FDA, concedeu o status de orphan drug para o fármaco imunomodulador P-Mapa, desenvolvido pela rede de pesquisa Farmabrasilis, para uso no tratamento de esquistossomose.  A concessão desse status é uma forma de o governo norte-americano incentivar o desenvolvimento de medicamentos para doenças com mercado restrito, com uma prevalência de até 200 mil pessoas nos Estados Unidos, embora em outros países possa ser maior. Globalmente, a esquistossomose é uma das principais doenças negligenciadas, que atinge cerca de 200 milhões de pessoas no mundo e cerca de 7 milhões no Brasil.  Entre outros benefícios, o status de orphan drug confere facilidades para a realização de ensaios clínicos, após os quais, se bem-sucedidos, o fármaco poderá ser registrado e distribuído nos Estados Unidos, no Brasil e em outro...